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profissão de motorista de aplicativo pode deixar de existir nos próximos dez anos. Essa é a previsão de Dara Khosrowshahi, CEO da Uber, que acredita que a evolução da inteligência artificial e dos veículos autônomos tornará dispensável a presença de condutores humanos no transporte individual. Em entrevista ao Wall Street Journal, o executivo afirmou que, no intervalo de 15 a 20 anos, a tecnologia será capaz de superar o desempenho de qualquer motorista. “Daqui a 15 ou 20 anos, o veículo autônomo vai dirigir melhor do que qualquer motorista humano”, declarou. Segundo ele, essa superioridade se dará pelo fato de que os sistemas autônomos serão treinados com uma quantidade de dados correspondente à experiência acumulada por milhões de condutores ao longo da vida, algo impossível para qualquer ser humano alcançar. Além disso, destacou que robôs não estão sujeitos a distrações, um dos fatores que mais contribuem para acidentes.

Veículos autônomos já apresentam um índice menor de acidentes em comparação aos conduzidos por motoristas humanos

Estudos indicam que os veículos autônomos já apresentam um índice menor de acidentes em comparação aos conduzidos por motoristas humanos. Dados da University of Central Florida mostram que, ao analisar registros da Califórnia e informações da National Highway Traffic Safety Administration (NHTSA) entre 2016 e 2022, os pesquisadores constataram que os carros sem condutor estiveram envolvidos em menos colisões, especialmente em impactos traseiros e laterais. Essa estatística reforça o argumento de que a automação pode tornar o trânsito mais seguro, reduzindo a frequência de sinistros e, consequentemente, alterando o funcionamento do mercado de seguros. Afinal, se a direção autônoma reduz a taxa de acidentes, o que acontecerá com os tradicionais contratos de seguro baseados no perfil do condutor?  

Necessidade de reavaliar as diretrizes que regulam a responsabilidade em caso de acidentes e a maneira como as seguradoras calculam suas tarifas

A transição para um modelo de transporte baseado em inteligência artificial já está em andamento. Empresas como Tesla e Waymo vêm testando veículos sem motorista em cidades como São Francisco e Las Vegas, onde robôs-táxis operam comercialmente em rotas específicas. A Tesla divulgou recentemente imagens de seus veículos se deslocando sem intervenção humana dentro da própria fábrica, demonstrando que a tecnologia já consegue operar de forma independente em ambientes controlados. Além disso, a empresa de Elon Musk revelou planos para lançar o Cybercab, um modelo de táxi autônomo sem volante e pedais, projetado para operar sem qualquer supervisão humana. Se essa tendência se consolidar, será necessário reavaliar completamente as diretrizes que regulam a responsabilidade em caso de acidentes e a maneira como as seguradoras calculam suas tarifas. 

Os desafios técnicos ainda existem e não podem ser ignorados

Apesar do otimismo das grandes empresas do setor, os desafios técnicos ainda existem e não podem ser ignorados. A pesquisa já citada da University of Central Florida apontou três situações em que os veículos autônomos apresentam um desempenho inferior ao dos motoristas humanos. Durante períodos de transição entre dia e noite, como amanhecer e anoitecer, o risco de colisão foi cinco vezes maior nos automóveis sem condutor. Além disso, ao realizar curvas, a taxa de acidentes entre veículos autônomos foi o dobro da registrada por motoristas humanos. Essas dificuldades estão diretamente relacionadas à capacidade dos sensores de interpretar mudanças bruscas de iluminação e calcular trajetórias em curvas, o que mostra que a tecnologia ainda enfrenta barreiras antes de atingir um nível de eficiência completo.  

Seguradoras precisarão criar modelos de apólice focados na tecnologia embarcada e no desempenho dos sistemas de IA

Diante desse cenário, as seguradoras precisarão considerar novos critérios para precificação dos seguros e adaptação das coberturas. Atualmente, os contratos de seguro são baseados no comportamento do motorista, levando em conta fatores como idade, histórico de infrações e quilometragem percorrida. No entanto, quando a direção autônoma se tornar predominante, a responsabilidade pelos acidentes poderá recair sobre os fabricantes e desenvolvedores de software, e não sobre os passageiros. Nesse contexto, as seguradoras precisarão criar modelos de apólice focados na tecnologia embarcada e no desempenho dos sistemas de inteligência artificial, deslocando o foco da análise de risco do condutor para a segurança do veículo e da sua programação.  

Ausência de um motorista humano no processo de condução exigirá mudanças profundas na legislação e na regulamentação das seguradoras

Outro impacto relevante pode estar na redução da demanda por seguros individuais. Se os carros particulares forem gradualmente substituídos por veículos autônomos compartilhados, como os táxis sem motorista, a necessidade de seguros tradicionais para motoristas pode diminuir, abrindo espaço para contratos voltados às empresas de tecnologia e operadoras de frotas de transporte. Em contrapartida, novos desafios surgirão, como a definição de responsabilidades em caso de falha do sistema. Se um veículo autônomo colidir com outro, quem será responsabilizado? O proprietário do carro, a empresa responsável pela tecnologia ou o fabricante do hardware? A ausência de um motorista humano como figura central no processo de condução exigirá mudanças profundas na legislação e na regulamentação das seguradoras.  

Impactos na dinâmica da mobilidade urbana

Além do impacto no setor de seguros, a automação do transporte pode transformar a própria dinâmica da mobilidade urbana. A promessa de um tráfego mais seguro e previsível pode estimular a reconfiguração das cidades, reduzindo a necessidade de estacionamentos e otimizando o fluxo de veículos. Outra possível consequência é o impacto no transporte público. Se os serviços de robotáxis se tornarem acessíveis e eficientes, poderão competir diretamente com ônibus e metrôs, alterando as estratégias de planejamento urbano. Por outro lado, a eliminação da figura do motorista pode gerar alguns efeitos sociais, especialmente para trabalhadores que dependem da profissão como principal fonte de renda.  

A transição para a mobilidade autônoma pode levar a mudanças estruturais no setor

Se a previsão do CEO da Uber se concretizar, a sociedade terá que se adaptar a essa nova realidade de forma estratégica. As seguradoras precisarão reformular seus produtos e encontrar novas formas de operar, o que pode levar a mudanças estruturais no setor. Já os órgãos reguladores terão que acompanhar a evolução da tecnologia para garantir que as legislações de trânsito e seguro sejam compatíveis com os novos desafios. Para os cidadãos, a transição para a mobilidade autônoma pode representar tanto oportunidades quanto incertezas, exigindo um debate amplo sobre os impactos dessa transformação nos seguros, na economia, no mercado de trabalho e na organização das cidades.

Postado em
28/2/2025
 na categoria
Tecnologia

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