precificação de seguros sempre esteve associada a fatores estatísticos e probabilísticos que permitem às seguradoras estimar riscos com base em históricos e características fixas dos segurados. Durante décadas, esse modelo foi a principal ferramenta para definir valores e garantir a sustentabilidade do setor. No entanto, com o avanço das tecnologias de monitoramento e análise de dados em tempo real, um novo método começou a ganhar espaço: o seguro baseado no comportamento do motorista.
Modalidade de seguro vem com algumas barreiras estruturais e culturais
Diferente das abordagens convencionais, esse formato avalia diretamente o modo como o segurado age, permitindo ajustes personalizados nas apólices com base em hábitos e práticas cotidianas. Apesar de sua promessa de maior justiça e eficiência na precificação, a adoção desse modelo vem com algumas barreiras estruturais e culturais, que podem tanto impulsionar sua expansão quanto limitar seu alcance.
Disparidade entre a percepção dos segurados sobre suas próprias atitudes e a realidade captada pelos dados
Conforme matéria divulgada no portal Insurance thought leadership, um dos principais obstáculos à aceitação do seguro baseado em comportamento está na disparidade entre a percepção dos segurados sobre suas próprias atitudes e a realidade captada pelos dados. De acordo com uma pesquisa da seguradora Justos feita com mais de mil condutores brasileiros, apesar de 98% dos respondentes se considerarem bons motoristas, muitos ainda adotam atitudes perigosas ao volante. Essa contradição pode gerar resistência ao modelo quando ponderada a longo prazo, uma vez que os segurados podem não compreender ou aceitar reajustes em seus prêmios com base em hábitos que não enxergam como problemáticos. Para que haja uma abordagem bem-sucedida no futuro, seria interessante que as seguradoras investissem em estratégias de conscientização, o que permitiria aos clientes compreender a relação entre suas ações e os custos do seguro.
Os benefícios devem ser atrativos o suficiente para estimular a adoção de comportamentos mais seguros
Além da percepção individual, uma outra questão a ser ponderada para a aceitação do seguro baseado no comportamento é a efetividade dos incentivos financeiros para promover mudanças de atitude. A premissa central desse modelo é a de que motoristas mais cuidadosos devem pagar menos, enquanto aqueles que assumem riscos maiores terão tarifas ajustadas de acordo com suas práticas. No entanto, para que isso se torne um motivador real, é necessário que os benefícios sejam atrativos o suficiente para estimular a adoção de comportamentos mais seguros. Caso as variações nos prêmios sejam pequenas, ou se os ajustes forem percebidos como arbitrários, os consumidores podem não se engajar no modelo da maneira esperada. As seguradoras, portanto, precisam equilibrar a precificação para que os impactos sejam visíveis, sem que se tornem excessivos a ponto de afastar os clientes.
Mudar hábitos no trânsito exige um esforço coletivo que vai além da atuação das seguradoras
Ainda que o seguro baseado no comportamento tenha potencial para reduzir a quantidade de sinistros, sua implementação não garante automaticamente um impacto positivo na segurança viária. Mudar hábitos no trânsito exige um esforço coletivo que vai além da atuação das seguradoras. Se esse modelo for adotado sem uma estratégia que envolva também políticas públicas e campanhas educativas, há o risco de que sua influência se limite a ajustes tarifários sem promover uma real transformação na cultura de direção. A colaboração entre diferentes agentes, incluindo órgãos reguladores e iniciativas de conscientização, pode ser decisiva para que os dados coletados sejam utilizados não apenas para precificar o risco, mas também para orientar mudanças estruturais na forma como a segurança no trânsito é trabalhada.
Impacto dessa modalidade de seguro na segmentação do mercado
Outro ponto relevante diz respeito ao impacto dessa modalidade de seguro na segmentação do mercado. A promessa de que a precificação será mais justa pode, por outro lado, tornar o acesso ao seguro mais difícil para determinados grupos. Se a lógica do modelo for levada ao extremo, motoristas considerados de maior risco podem enfrentar dificuldades para contratar uma apólice ou encontrar tarifas muito elevadas, criando um cenário de exclusão. Esse fenômeno poderia comprometer o princípio do seguro como um instrumento de compartilhamento de riscos e levar a uma situação onde apenas os condutores com perfis mais seguros conseguiriam obter contratos vantajosos. Para evitar distorções dessa natureza, é preciso estabelecer limites na precificação e garantir que a acessibilidade ao seguro não seja comprometida.
Seguradora Justos é exemplo brasileiro de que é possível tornar essa modalidade uma alternativa viável e rentável
Apesar dessas dificuldades, há exemplos concretos de que o seguro baseado no comportamento pode funcionar e ser bem aceito pelo público. No Brasil, seguradoras como a Justos já colocaram esse modelo em prática, demonstrando que, com a abordagem certa, é possível superar os desafios iniciais e tornar essa modalidade uma alternativa viável e rentável. Entre os fatores que contribuem para o sucesso dessas iniciativas estão a transparência na comunicação com os clientes, a oferta de benefícios tangíveis e um sistema de monitoramento que permite aos segurados acompanhar seu próprio desempenho e entender como seus hábitos impactam os custos do seguro.
Se bem estruturado, esse modelo pode tornar o sistema de avaliação e precificação de riscos mais alinhado às particularidades dos segurados
O avanço da tecnologia e a digitalização dos serviços financeiros indicam que o seguro baseado no comportamento tende a ganhar mais espaço nos próximos anos. Se bem estruturado, esse modelo pode representar uma transformação na precificação e avaliação dos riscos, tornando o sistema mais eficiente e alinhado com as particularidades de cada segurado. Entretanto, sua consolidação dependerá da capacidade do setor de equilibrar inovação com acessibilidade, garantindo que a personalização da precificação não acabe criando barreiras para quem precisa do serviço.
Experiência das empresas que já atuam nesse segmento no Brasil mostra que há espaço para o crescimento dessa modalidade
O futuro desse modelo será determinado pela maneira como o mercado e os consumidores responderão a essas mudanças. Se as seguradoras conseguirem apresentar soluções que sejam tanto vantajosas para os clientes quanto financeiramente sustentáveis, o seguro baseado no comportamento poderá se firmar como um padrão na precificação de apólices. A experiência das empresas que já atuam nesse segmento no Brasil mostra que há espaço para o crescimento dessa modalidade, mas seu alcance dependerá de ajustes contínuos e da aceitação dos consumidores.