nsurtech, neologismo inglês surgido a partir da composição dos substantivos insurance (seguro) e technology (tecnologia), poderia ser traduzido, literalmente, como "seguradora tecnológica". Mas, assim como no Brasil, a palavra foi introduzida sem tradução no vocabulário do setor de seguros em todo o mundo. Não só a imprensa especializada, mas grandes publicações de Espanha, Itália – até mesmo da França, onde o estrangeirismo na língua é absolutamente repudiado –, adotaram "insurtech" para se referir às startups que, sem qualquer sombra de dúvida, estão revolucionando a indústria dos seguros. (Aliás, startup – uma empresa virtual, totalmente digital – é outro neologismo prontamente adotado em todos os cantos, neste novo universo econômico disruptivo.)
No Brasil, segundo a plataforma de inteligência de dados Distrito, o número de insurtechs cresceu mais de 200% nos últimos cinco anos – eram 37, em 2015; e 109, em 2020. Não existe uma pesquisa comparativa sobre a expansão das insurtechs em relação aos outros setores da economia. Mas, tomando como base a variação do produto interno brasileiro (PIB), é possível afirmar que o crescimento no setor é um dos maiores do país no período.
“O que se tem observado no setor é cada vez mais a construção de parcerias entre os atores da indústria, de dentro e de fora, para o atendimento dos interesses do consumidor, colocando-o como centro do mercado. Isso é uma tendência em outros setores da economia também, fazendo uso da tecnologia quando, de fato, agrega valor a esta relação”, Eduardo Fraga
Segundo o diretor da Superintendência de Seguros Privados (Susep), Eduardo Fraga, no Brasil, as insurtechs têm atuado assumindo riscos de seguro, ou na cadeia de valor, apoiando seguradoras já estabelecidas. “No primeiro caso, referenciamos o Sandbox, regulatório promovido pela Susep. Com seis empresas em operação, das dez que receberam autorização no primeiro edital, em 2020, os dados indicam que, em menos de um ano, mais de 350 mil apólices foram subscritas, com prêmios de aproximadamente R$ 20 milhões”, afirma Fraga. “E, conforme informações passadas pelas empresas, um percentual relevante dos consumidores representa pessoas que nunca haviam adquirido produtos de seguro”, acrescenta. Já no segundo caso, de acordo com Fraga, as insurtechs que atuam por meio de parcerias com seguradoras têm agregado bastante às etapas da cadeia de valor do seguro, “desde a captação de consumidores, subscrição, pós-venda, gestão operacional, regulação de sinistros, identificação de possíveis fraudes, gestão de reclamação, entre outros processos”.
“Todas essas iniciativas, sem exceção, são muito benéficas para o setor, na medida que buscam colocar o consumidor como centro do mercado, inclusive respeitando as diversidades de preferências”, ressalta o diretor da Susep.
“Para o nosso mercado, pouco servido e com nível de penetração na economia muito abaixo dos países desenvolvidos, o movimento natural e esperado é justamente o da inclusão social e democratização dos seguros através do uso de novas tecnologias e, principalmente, da digitalização das ofertas”, Sami Hazan
Esse foco das insurtechs centralizado no cliente, até mais do que o aporte de tecnologia e virtualização que promove no setor, também é destacado pelo consultor em transformação digital Samy Hazan, professor e coordenador de programas em inovação na Escola Nacional de Negócios e Seguros (ENS). “Muitos falam sobre movimentos disruptivos das insurtechs presenciados em mercados maduros. Mas, no Brasil, estamos vendo em maior grau uma tendência de inclusão e democratização dos seguros na sociedade. E, em menor grau, a disrupção”. Para complementar, observa Hazan: “Para o nosso mercado, pouco servido e com nível de penetração na economia muito abaixo dos países desenvolvidos, o movimento natural e esperado é justamente o da inclusão social e democratização dos seguros através do uso de novas tecnologias e, principalmente, da digitalização das ofertas”. Hazan cita algumas insurtechs – Minuto Seguros, Pier Seguros, Azos Seguros, que qualifica como as “mais notáveis do Brasil” – como exemplos dessa democratização virtual. “Essas empresas, entre outras, têm relatado que, em média, dois terços de sua clientela nunca haviam comprado seguro antes – ou seja, são consumidores emergentes que estavam fora do sistema e, muitas vezes, sem nenhuma proteção pessoal ou patrimonial”, destaca o professor.
“A chegada das insurtechs traz novas ideias ao mercado segurador, e vai impulsionar a criação de produtos e melhorias aos que já existem”, Jacques Depocas
O objetivo das insurtechs é possibilitar a contratação do seguro de forma online, sem intermediários. Em caso de sinistro, prometem um processo totalmente digital, rápido, sem burocracia e muito eficiente. O Sandbox da Susep acelera o lançamento de novos produtos e agiliza o processo de aprovação deles. “A chegada das insurtechs traz novas ideias ao mercado segurador, e vai impulsionar a criação de produtos e melhorias aos que já existem”, ressalta Jacques Depocas, CEO da SeguroLink, uma insurtech que combina no mesmo ambiente duas ferramentas: um sistema multicálculo de seguros e uma plataforma de gestão de corretoras. “No Brasil, a maioria das insurtechs são seguradoras B2C, que oferecem seguros para celulares e acidentes pessoais. Existem muitos concorrentes indo atrás da mesma fatia de mercado e o foco parece ser os consumidores que já estão acostumados a fazer compras online”, complementa.
Entretanto, segundo Depocas, ainda não está comprovado que o consumidor brasileiro está pronto para comprar seus seguros online. “Há dez anos, surgiram muitas corretoras na internet. A maioria delas não existe mais porque tiveram taxas de conversão baixíssimas. Os clientes potenciais chegavam a fazer muitas cotações online, mas sem nenhuma intenção de comprar o seguro. Só queriam ter um preço de referência para negociar com o corretor que já conheciam, pois se sentiam mais seguros fechando o seguro com ele, em vez de numa corretora virtual”, conta. E o CEO da SeguroLink faz um alerta: “Isso talvez se repita com as seguradoras digitais que estão entrando no mercado agora”.
Por sua vez, o diretor da Susep põe panos quentes, e acredita que os mercados vão se alterando e evoluindo conforme os hábitos dos consumidores vão mudando ao longo do tempo. Na visão de Eduardo Fraga, “é relevante haver alternativas que atendam todos os perfis de clientes, suas preferências e forma de consumo, respeitando a diversidade, afinal, os consumidores não são iguais”. Ele conclui: “O que se tem observado no setor é cada vez mais a construção de parcerias entre os atores da indústria, de dentro e de fora, para o atendimento dos interesses do consumidor, colocando-o como centro do mercado. Isso é uma tendência em outros setores da economia também, fazendo uso da tecnologia quando, de fato, agrega valor a esta relação”.
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